O Alarme
Por Ana Kessler
Sim, existe um alarme para cada relação. Um alarme que nos avisa quando a fumaça está só no início. Ele detecta o desgaste, as primeiras palavras rudes. E começa a piscar. Conforme o tom de voz aumenta, a frequência dos embates sobe, ele pisca com mais intensidade. Uma desavença aqui, três dias sem se falar ali, choro no banheiro acolá, noites sem dormir, olhos inchados na maior parte do tempo, eis o alarme soando.
E você?
Você corre na farmácia para comprar tampões de ouvido. Remédio pra insônia. Pílulas pra depressão. Você fecha as portas dos cômodos para não ouvir o barulho incômodo, nem ver a luz do óbvio, vermelha, chamando sua atenção. Mas o alarme está lá. Você passa do quarto pra cozinha, e ele soa. Você diz a si mesma: estou no meu limite, não aguento mais essa situação. E o que faz? Respira fundo, e aguenta mais um dia.
Não querer lidar com o problema não fará o problema desaparecer. Não encarar de frente os ajustes necessários ao seu relacionamento, aquela conversa difícil, a negociação de individualidades, dos limites de cada um, não resolver as mágoas no momento do ocorrido e jogá-las no reservatório de ressentimento futuro, veja bem, nada disso vai desligar o alarme.
Você sabe o que tem que fazer. Aliás, você sempre soube, desde o início, quando a primeira faísca aconteceu. A procrastinação emocional, o deixar pra resolver depois as pendências do coração e da alma azedaram a relação e agora, cada vez mais, está bem difícil de resolver.
Pois é.
Tenho uma boa notícia: difícil não é impossível. Pegue uma chave de fenda, arme-se com manuais, muita calma, disposição e rede de apoio, olhe bem para o desgraçado do alarme, e diga em voz alta: vai ser hoje, meu bem. Chame o seu amor para aquela conversa, leve a sua melhor escuta, não leve nada para o lado pessoal.
Resolvam o assunto como adultos. Nada de marretas, jogo de empurra-empurra, culpa pra cá e pra lá. Escutem-se. Abracem-se com os ouvidos. Espere do outro o que você oferecer, por isso, ofereça o seu melhor.
Lentamente, você perceberá o alarme silenciando. Seja porque o incêndio foi apagado, seja porque acabou a energia e a intenção de tentar. Entre sentimentos mortos e feridos, você sobreviveu. Agora é limpar a fuligem e as lágrimas do rosto, arregaçar as mangas e reconstruir a sua relação a dois ou a sua nova vida solo.
Missão cumprida. Você conseguiu. Respire fundo e absorva o silêncio que impera. O aroma de paz. Não tenha medo, o pior já passou. Abra as janelas, deixe o ar fresco entrar. Ares de renovação. Abra também um sorriso. Um espumante. Um brinde: à nova domadora de alarmes do pedaço. Daqui pra frente, quando ele inventar de soar, caixa de maturidade à mão, ferramentas a postos, você já sabe o que fazer. Apenas, faça.
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